A Palavra de Deus declara enfaticamente
que há somente um mediador entre Deus e os homens (I Tm. 2:5). Todo crente acredita nessa verdade, mas eu convivo com
centenas de irmãos que estão esperando que eu seja mediador entre elas e Deus. São
pessoas que não conseguem assimilar a visão.
O que isso realmente tem a ver com a
visão? É muito simples. Nós declaramos que cada crente é um ministro ou
sacerdote, isso significa que ele não precisa de ninguém para ser o seu
mediador diante de Deus.
Não estou dizendo que nós não
precisamos uns dos outros ou do conselho de irmãos mais velhos, mas é pecado
procurar alguém para ajudá-lo antes de buscar a Deus. Você espera que alguém
resolva o seu problema, mas você não levou esse problema em oração ao Senhor.
Isso significa que você confia mais no homem do que em Deus, ou pelo menos
acredita que ele está mais perto de Deus e por isso mesmo pode ser o seu
mediador.
Alguns esperam que eu lhes diga qual é
a vontade de Deus para a vida deles, outros esperam que eu explique o
significado de coisas que têm acontecido com eles, ainda outros esperam que
lhes revele os mistérios que eles não entendem. Agora eu gosto de abençoar as
pessoas e, obviamente, eu faço o meu melhor para ajudá-los. Mas esse tipo de
questão deve ser levada diante de Deus e não diante de homens.
Sendo cada crente um ministro, o nosso trabalho como líderes é
equipá-las para que sejam capazes de falar com Deus e receber dele direção
sobre essas dúvidas e problemas.
O papel de um pastor não é ser a voz de
Deus, mas é ajudar as pessoas a se conectarem com Deus - para que eles possam
ouvir a voz do Senhor por eles mesmos. É evidente que Deus fala conosco através
de nossos irmãos, inclusive do pastor, mas precisamos ter cuidado para não
transformá-los em voz de Deus.
Quando você enfrenta uma situação
difícil, para quem você liga primeiro? Para o seu pastor ou para Deus?
Quando você não entende um versículo da
Bíblia para quem você se volta? Para o seu pastor ou a Deus?
Não entenda errado. Nós precisamos uns
dos outros e Deus certamente usa nossos irmãos para falar conosco. O que estou
tentando lhe dizer é que infelizmente a mentalidade de muitos crentes é a de um
mediador.
Há um oráculo que falará para você tudo
o que Deus quer lhe dizer. Isso talvez fosse verdade no Velho Testamento, mas
já não é mais assim. Nesses dias do Novo Testamento cada crente foi feito um
sacerdote e cada um pode ouvir de Deus individualmente sem nenhum mediador que
não seja Cristo Jesus.
Não faça do seu pastor, discipulador ou líder uma muleta do seu
relacionamento com Deus. Tudo bem ter uma muleta momentaneamente enquanto
não podemos andar, mas devemos ser capazes cada vez mais de andar sem muletas
na medida em que crescemos.
Se não compreendermos claramente a
visão transformaremos o discipulado numa distorção do cristianismo. Muitos
discipuladores estão inadvertidamente se transformando em mediadores entre Deus
e seus discípulos.
O centro do discipulado
A ilustração dos corações cocêntricos
pode ser útil para compreendermos a prioridade de Deus.
Essa ilustração nos mostra o nível de
cada um no entendimento do propósito eterno de Deus. Alguns estão no nível mais
básico de compreensão do Reino de Deus. Nesse nível estão aquelas pessoas
que querem fazer coisas para Deus. Não se preocupam muito com o desejo do
coração de Deus, só desejam realizar coisas boas, relevantes e úteis para os
necessitados.
No segundo nível estão aqueles que
entenderam que há algo mais central no coração de Deus: a Igreja. Essas pessoas
se reúnem nas chamadas missões para-eclesiásticas. Elas compreendem que o que
importa é pregar o Evangelho, mas não percebem que pregar o Evangelho não é tudo,
é preciso edificar as pessoas e essa edificação só é possível no âmbito da
igreja local.
No próximo nível em direção ao centro
estão aquelas pessoas que compreenderam que a igreja local é algo mais central
no coração de Deus. Muitas igrejas avançaram apenas até esse nível. Por isso
vivem de grande eventos, programas e celebrações.
Outras porém têm avançado na revelação
do coração de Deus e perceberam que uma igreja somente pode ser edificada por
meio de grupos menores que temos chamado de células. Hoje nós estamos nesse
estágio e já é algum avanço, mas ainda há algo mais central que as células. O
estágio seguinte é o discipulado. Na própria célula há um ponto central. A
célula não é o ponto final da visão.
Mas se pararmos aqui teremos apenas uma
religião organizada. Existe ainda algo que é mais central que todas coisas. O
discipulado possui um ponto central e esse ponto é “Cristo dentro de nós”.
O centro do evangelho é Cristo dentro de nós. O alvo de Deus é que cada
um de seus filhos seja guiado pelo Espírito que hoje habita dentro do nosso
espírito humano regenerado.
O alvo do discipulado, portanto, é
levar as pessoas a experimentarem o controle de Cristo em suas vidas por meio
do Espírito Santo. Não temos discípulos nossos realmente, não os temos para nós
mesmos, mas para levar cada um deles a conhecer a Cristo.
Todos são na verdade discípulos do Senhor. Nosso trabalho como
discipuladores é levá-los a aprender a sentir, a ouvir e perceber a voz do
Cristo vivo dentro deles. Devemos ensinar o que o Evangelho diz a respeito a
Cristo e da vontade dEle se cumprindo em cada um. Temos a obrigação de ser
modelos de vida, não para que eles olhem para nós, mas para que vejam a Cristo
em nosso viver diário.
Cristo é o centro de tudo, ninguém é
dono de ninguém e tão pouco o discipulado é um sistema eclesiástico, mas um
relacionamento de vida. Não é questão de morar juntos, nem de ter uma
intimidade tal a ponto de andar juntos o dia inteiro. Não é o discipulador que
muda a vida do discípulo. Isso é obra do Espírito Santo e da Palavra de Deus
operando nele.
Os que buscam muita intimidade supõem
de maneira carnal que é a capacidade do homem que nos muda. Então imaginam que
se ficarem suficientemente próximos e por tempo suficiente do seu discipulador
então eles serão outra pessoa. Mas o que nos transforma é contemplarmos o
Senhor, por isso o bom discipulador
aponta para Cristo.
O discipulado não é uma mera amizade,
mas sim um relacionamento voltado para um propósito, o propósito de ver Cristo
sendo formado em uma pessoa para que essa pessoa possa ser enviada e gerar
muitos filhos para Deus. Todos devem sempre se lembrar: o centro da nossa obra é o Espírito Santo, que é Cristo em nós.
Todo crente precisa ter um
discipulador. Alguém reconhecido como autoridade para ensiná-lo e conduzi-lo
nesse caminho de aprender a ser guiado pelo Espírito para gerar muitos filhos
para Deus e assim edificarmos a igreja.
Sem dependência ou manipulação
O discipulado é muito importante, mas
ele pode se tornar um problema se não percebemos que existe algo mais central
na vida cristã. O ponto central da vida cristã é “Cristo em nós”. Isso significa que o alvo do discipulador é levar
ser discípulo a ouvir o Espírito e seguir a sua voz. Não temos discípulos
realmente. Os discípulos são de Cristo. Somos como placas sinalizadoras
apontando para Cristo.
Quando não entendemos a centralidade de
Cristo podemos incorrer em certos desequilíbrios que precisam ser evitados.
Podemos cair no buraco da dominação sobre o discípulo e o discípulo, por sua
vez, pode cair no erro da superdependência.
Qualquer método de discipulado que
induz as pessoas a seguirem um líder e a obedecer a regras e não a Cristo é
fundamentalmente maligno! Todo discipulado deve levar as pessoas a serem como
Cristo e este deve ser o grande alvo de todo discípulo. E tudo o que tirar
Cristo do centro, seja um método bom ou um ótimo sistema de discipulado deve
ser completamente removido do nosso meio.
Discipuladores que não compreendem que
o centro do discipulado é levar o discípulo a ouvir de Cristo em seu espírito
normalmente levam os discípulos a dependerem deles. Eles se colocam como mediadores
entre o discípulo e Deus. Infelizmente estão completamente fora da visão, na
verdade a estão destruindo.
Quando discipuladores se colocam como
mediadores espirituais, os discípulos passar a depender dele em tudo. Os
discipuladores passam a ser o seu guia espiritual, decidindo tudo pela pessoa.
Eles decidem se o discípulo deve ou não
vender o carro, se viaja ou não, se deve ou não se relacionar com determinada
moça ou rapaz! Esse nível de autoridade e de governo dos discipuladores sobre
os discípulos produz uma sensação de tranquilidade e passividade naquele que
está sendo discipulado. Afinal, ele já não precisa decidir sobre nada e nem
mesmo preocupar-se em orar a respeito. Seu discipulador cuida de tudo!
E tem muita gente que gosta disto! Os
discípulos sentem-se tranquilos porque já não precisam orar nem buscar a Deus
sobre este ou aquele assunto nem correm o risco de tomar decisões erradas. Se
alguém errar, será o discipulador. Todavia isto não é discipulado. É
manipulação religiosa e não discipulado.
No discipulado verdadeiro ensinamos os
discípulos a dependerem de Deus e a buscarem sua vontade. Como agir numa
situação onde o discípulo procura orientações? Uma atitude simples é orar junto
com o discípulo e levá-lo a tomar uma decisão. O discipulador deve mostrar
todas as saídas possíveis e deixar que ele decida. Se como discipuladores não
entendemos certos assuntos, devemos recomendá-los a buscar o conselho de
outras pessoas naquela área específica.
Em seguida deixe-o decidir. Se decidir
correto, amadurecerá no Senhor. Se errar, amadurecerá com mais rapidez ainda! E
jamais devemos culpá-lo por um eventual erro, e nem devemos nos culpar também.
O discipulado autoritário ao invés de
produzir maturidade, produz imobilidade espiritual. A pessoa cresce numa eterna
dependência em tudo, não aprende a depender de Deus e buscar a Cristo nas
mínimas coisas.
Tenha muito cuidado com o
assenhoramento sobre a vida do discípulo. A Palavra de Deus diz para
“guardarmos o rebanho de Deus que há entre nós, não como constrangidos, mas
espontaneamente, como Deus quer...; não como dominadores dos que nos foram
confiados, antes tornando-nos modelos do rebanho” (I Pe. 5:2-3).
A primeira coisa que temos que afirmar
com muita clareza e convicção é que todo discipulado é primeiramente a Cristo,
ou seja, todo discípulo é antes de tudo um discípulo de Cristo. O discípulo
deve ser discípulo de Cristo e não de homens!
Há uma tendência muito sutil no
trabalho de discipulado de se deixar levar pelo legalismo e pelo controle da
vida do discípulo. Discipuladores quando desconhecem as exigências de Jesus,
impõe suas próprias exigências. Já ouvi pastores afirmando que as pessoas
gostam de ser cobradas, de serem exigidas a vestir e a se comportar desta ou
daquela maneira, e que elas gostam de proibições. Alguém já chegou a afirmar
que os crentes gostam de pregadores que batem porque passam a ideia de um
evangelho mais sério. Mas o que temos visto frequentemente é apenas legalismo
religioso.
A autoridade no discipulado
A primeira base de edificação de um
discípulo é o reconhecimento do Senhor Jesus como Rei. Conversão significa
mudança de governo. A partir de agora a palavra de Deus é a base de nossa vida.
No reino há autoridades delegadas. Se
uma pessoa não reconhece autoridade não pode ser edificada, discipulada. A
submissão é a condição básica do discipulado. Sem submissão não há formação ou
discipulado.
Mas um risco que muitos
compreensivelmente temem é o abuso da autoridade por parte do discipulador. Por
isso o próprio discipulador precisa ser discípulo. O princípio básico para ter
autoridade é estar debaixo de autoridade.
Cada discipulador precisa entender que
ele é servo do discípulo e não o dono. Deve ensinar todo o Conselho de Deus e
não os seus gostos e preferências pessoais. Porque não temos discípulos de
fato, os discípulos são de Cristo.
Certos discipuladores presumem que
aquilo que pensam deve ser seguido pelo discípulo cegamente. Mas isso é um
absurdo. Um discípulo pode discordar e até debater uma ideia com seu
discipulador e ainda manter um coração submisso.
A palavra de um discipulador a seu
discípulo pode ser de três níveis:
a. A Palavra de Deus
Evidentemente diante da Palavra de Deus
a submissão de um discípulo deve ser completa e absoluta. Se um discípulo
ignora a palavra de Deus podemos então afirmar que ele é rebelde. Mas quando
digo “Palavra de Deus” estou me referindo especificamente a aquilo que está
escrito na Bíblia.
Se por exemplo um líder chega a mim e
diz: “Pastor, eu gostaria de namorar a Joaninha”. Eu lhe pergunto: “Quem é a
Joaninha?”. Ele então me responde que é uma moça que ele conheceu na escola e
que ainda não é convertida. Numa situação assim a Palavra de Deus diz
claramente que ele deve terminar esse relacionamento simplesmente porque não há
comunhão entre luz e trevas e eles estão se constituindo um jugo desigual (II
Cor. 6:14-18).
Nesse caso o discipulador pode ser
absolutamente diretivo e se o discípulo se recusa a ouvir a Palavra ele pode
ser considerado rebelde.
b. O Conselho do discipulador
O segundo nível de palavra é o
conselho. Conselhos são palavras baseadas na experiência e no conhecimento do
discipulador. Mesmo sendo um conselho bom e sensato, nesse caso a submissão é
relativa.
O discipulador tem mais experiência e
está apto a dar um conselho. Mas ele não pode obrigar o seu discípulo a seguir
cegamente seus conselhos. Nesse caso a submissão ao discipulador é relativa.
Por isso o discipulador deve persuadir e convencer seu discípulo a obedecer.
Vamos imaginar o seguinte exemplo. O
discípulo chega em mim e diz que gostaria de se casar com a Serafina. A menina
é crente fiel, mas tem apenas 16 anos e ele possui só 18. Eu lhe dou então um
bom conselho: “é melhor esperar um pouco mais porque vocês dois são muito
jovens.” É um bom conselho? Com certeza. Mas é Palavra de Deus? A Bíblia de
fato não diz com que idade alguém deve se casar.
Creio que o discípulo deveria ouvir meu
conselho, mas e se ele mesmo assim resolver se casar? Devo rejeitá-lo como
rebelde? Claro que não. Na verdade eu deveria dizer: “O melhor é que não se
case, mas já que vai se casar então vamos trabalhar para dar certo”.
Podemos aconselhá-los sem impor nosso
ponto de vista ou nossa autoridade. Mas o problema está exatamente aqui: Por
causa da ênfase na autoridade, sempre que aconselhamos, achamos que o nosso
conselho tem que ser seguido à risca. Somos os profetas dos últimos dias, que
recebemos toda a verdade para conduzir as pessoas na vida cristã. Se não somos
obedecidos, nossa tendência é rejeitá-los. É claro que precisamos dar
orientações claras aos discípulos. Entre elas a de que devem buscar em Deus a
resposta e não em nosso conselho!
Um discípulo, porém, que nunca ouve um
conselho do seu discipulador é orgulhoso e auto-suficiente. Apesar de não ser
necessariamente rebelde é resistente ao ensino e dificilmente pode ser
edificado. O bom discípulo precisa atentar para o conselho do seu discipulador,
mas um discipulador não pode obrigar o discípulo a seguir seu conselho.
A opinião do discipulador
O terceiro tipo de palavra do
discipulador são as suas opiniões. Opiniões expressam apenas as preferências e
gostos pessoais do discipulador. Não é necessário nenhum tipo de submissão às
opiniões e gostos pessoais do discipulador.
Vamos supor que o discípulo chegue a
diga ao discipulador: “Estou gostando da Cremilda”. O discipulador então
rapidamente interfere: “Mas a Cremilda? Ela é muito feia. Você pode conseguir
algo melhor”. Nem preciso dizer que essa opinião pode ser solenemente ignorada.
O problema acontece quando o
discipulador não compreende esses três níveis de palavra e resolve exortar seu
discípulo para que siga todas as suas opiniões humanas. Essa é a causa das
distorções e abusos que acontecem em muitas igrejas.
Não temos realmente discípulos. Os discípulos são de Cristo. E os discípulos
devem ouvir apenas aquilo que está em harmonia com a Palavra de Deus.